quarta-feira, novembro 09, 2005

Chamas Lascivas

A Rita levou meu sorriso
No sorriso dela, meu assunto
Levou junto com ela o que me é de direito
Arrancou-me do peito e tem mais
(...)
Levou os meus planos, meus pobres enganos
Os meu vinte anos, o meu coração
E além de tudo
Me deixou mudo um violão
A Rita
Chico Buarque

A Rita em questão se chama Cristiane.

Engraçada esta vidinha nossa. Um dia está tudo caminhando, o nosso cotidiano de merda, trabalhando pra quitar prestações e reservando a grana da bebedeira. Toda Sexta era sagrada! Assim vamos tocando em frente, em alguns momentos até com relativa graça e charme. Mandando ver.

Daí pintou uma morena. Baixinha, cabelos lisos compridos, bunda arrebitada e olhos castanhos. Os seios não eram nem grandes e em pequenos, mas daquele tamanho que bastava preu me divertir uma noite toda, beijando seus bicos escuros, pretos, afiados. O quadril era uma coisa especial, o melhor de seu corpo. Ali eu metia as mãos, contornava com um abraço e ficava só sentindo sua respiração e o cheiro de seus cabelos. Porra... Não é que eu me apaixonei!

O que mais me prendia na Cristiane era a sua mania de discutir em cima de tudo que eu falava. Ficava me perguntando e ouvia, atenta, abraçada. Quando eu dava uma pausa, concentrado no que dizia, ela me apertava forte e fazia um dengo, uma coisa com a boca, uma voz bem baixinha, um sussurro... Eu pirava, esquecia de toda a estante de filosofias. Exatamente neste ponto ela retomava meus raciocínios e fazia perguntas capciosas. Prestava atenção com um charme que me deixava de pau duro.

De vez em quando ela se cansava e ficava me repetindo, imitando meus jeitos, minha excitação. Outras vezes vinha com frases prontas, lidas ou vistas não sei onde, e afirmava em gargalhadas que intelectual só fala e fala. Era o ponto, nosso acordo secreto ou passe mágico, que me libertava de qualquer estupidez ou convenção. Dali pra frente era sexo com cheiros, suores, gostos, líquidos, chupadas e apertões.

O melhor era depois. Ela me enlaçava e passava os dedos em alguns ossos, nas palmas das mãos, nádegas e boca. Depois apenas repousava seu corpo moreno no meu, branco de alemão escandinavo. A gente ria disto. O resto era silêncio sem nenhum constrangimento, apenas a delícia rara de estar completamente nu e natural com alguém sem ter que dizer ou fazer absolutamente nada.

Brigamos e ela foi do jeito que chegou: segura. ‘Pro caralho com esta saudade!’, penso quando a falta aperta. Não sei. Os amigos dizem que ela não me servia, que não me amava e nem bastava, que a moça só sabia pensar em si e que me fazia de besta. Quem sabe?

Porra... Daí foi um desencanto só. Só. Deu um tempo e fugia do espelho pra não ter que me olhar nos olhos. Podia ser besteira, mas assim era. Entretanto, quase não chorei, pois não entendia bem no que isto poderia me ajudar. Sem sobressaltos, esperei o andamento natural das coisas. Homem que tinha responsabilidades e uma montanha de livros para abrir. Foi.

Pois é. Cotidiano de merda novamente, metido até o pescoço. Mais e mais lembro da Cris. A morena me seqüestrou da vida de repartição, educou os meus sentidos com deliciosos vícios e ascendeu toda a chama lasciva e libidinosa.

Será que ela está com alguém? Ainda faz os dengos com a voz? Contorna os ossos? Escuta com atenção quando ele fala? Será que ela pensa em mim?

Ah... Pro caralho com esta saudade!

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

muito bonito o texto. foi verdade?



beijos

11:33 PM  
Anonymous Anônimo said...

Eu a-d-o-r-e-i o texto ! Pra você ter idéia do quanto, com ele você acaba de ser promovido e entrar na minha ronda oficial dos blogues. Grande coisa, você dirá, com toda razão. Mas é só uma maneira de dizer que, a partir dele, o que eram visitas esporádicas passam a ser encontros regulares. Eu eu acho o máximo homens que se desnudam.
Aquele Abraço!

12:45 AM  

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