Entre seus rins OU Questão de gênero
(Reviravolta histórica: não é mais o sexual que é
indecente, é o sentimental – censurado em nome
daquilo que não passa, no fundo, de uma outra moral.)
Fragmentos de um discurso amoroso
Roland Barthes
Creia-me, não é preciso apressar o fim da
voluptuosidade, mas chegar lá insensivelmente após
atrasos que a prorrogam. Quando você tiver achado
o lugar que a mulher gosta de ser acariciada, o pudor
não deve impedi-lo de acariciá-la. Você verá os
olhos de sua amiga brilharem com um lampejo trêmulo,
como acontece muito aos raios de sol refletidos
numa água transparente. Depois virão as queixas,
um delicado murmúrio, doces gemidos e as
palavras que servem ao amor. Mas não vá, retirando
mais véus, deixá-la para trás, ou permitir que ela
se adiante na marcha. Atinjam o alvo ao mesmo tempo;
é o ápice da volúpia, quando, ambos vencidos,
mulher e homem permanecem estendidos sem força.
A arte de amar
Ovídio
indecente, é o sentimental – censurado em nome
daquilo que não passa, no fundo, de uma outra moral.)
Fragmentos de um discurso amoroso
Roland Barthes
Creia-me, não é preciso apressar o fim da
voluptuosidade, mas chegar lá insensivelmente após
atrasos que a prorrogam. Quando você tiver achado
o lugar que a mulher gosta de ser acariciada, o pudor
não deve impedi-lo de acariciá-la. Você verá os
olhos de sua amiga brilharem com um lampejo trêmulo,
como acontece muito aos raios de sol refletidos
numa água transparente. Depois virão as queixas,
um delicado murmúrio, doces gemidos e as
palavras que servem ao amor. Mas não vá, retirando
mais véus, deixá-la para trás, ou permitir que ela
se adiante na marcha. Atinjam o alvo ao mesmo tempo;
é o ápice da volúpia, quando, ambos vencidos,
mulher e homem permanecem estendidos sem força.
A arte de amar
Ovídio
A vida segue aqui no sertão, meu sertão. Não está tão frio, mas o ar está seco. O gramado do jardim de casa começa a se tingir de marrom-claro e eu sinto muito sono. Como não estou na escola, minha maior dedicação está na literatura intercalada com sonecas curtas. Leio coisas sérias, escrevo chistes, trabalho na dissertação e, quando quero, adormeço um pouco. Água no rosto. Café. Quase sempre pensando em sexo.
Este é um ponto interessante: penso muito em sexo. Também, na minha idade... Creio que os velhos não pensam tanto em sexo não por culpa de alguma limitação física, estética, moral ou emocional. Não contemplam as idéias eróticas porque devem se dedicar aos assuntos da morte, do legado e, aos crentes, da nova vida. Eu sou um guri jovem – e que pensa, lê, vê e fala muito sobre sexo.
Queria é fazer mais.
A grande questão desta tarde de domingo é e seguinte: sexo e amor como a gigantesca questão de gênero. Explico melhor. Desde que voltei ao sertão tenho me esforçado em conhecer um grande número de mulheres. E não apenas pelas idéias, beleza, pelo toque, pelo gozo; quero conhecer mulheres por invejar o Chico Buarque quando escuto os elogios que lhe fazem por conhecer tão bem a “alma feminina”. Quero abrir a caixa de Pandora também!
Assunto espinhoso para um historiador formado após a revolução do Analles franceses e tudo o que balançou a história (enquanto prática de investigação) depois da requalificação do legado marxista e da psicanálise. Ou seja, devo estar atento aos estudos de gênero, aos avanços das mulheres e o quanto esta luta ainda precisa e deve continuar. Acontece que, saindo das bibliotecas, fico ofendido e irritado quando recebo a fatura pelos abusos masculinos. O peso e culpa de ter um pênis. É simples: também tive que romper com esta sociedade machista a patriarcal, da minha forma, com meus demônios. E também sou vitimado por ela.
Conversas e mais conversas, sempre embaladas por cerveja e, quando tenho dinheiro, vinho. E as novas conhecidas acabam voltando ao embate do sexo X amor, deixando o macho restrito às ereções do falo e a alma feminina com coisas mais sublimes, destinadas ao amor etéreo e belo.
Blá blá blá.
Ontem me aborreci. Na verdade, venho experimentando uns dois meses de chateação. Numa mesa de bar, seis jovens. Três homens e três mulheres. É claro que recebemos delas a clava de Neanderthal e um gutural uga-buga natural aos machos bêbados. Nossos sentimentos vistos com desconfianças enquanto elas se ocupavam em reclamar dos corações rompidos. E de tempos em tempos flertavam com uns barbudos da mesa ao lado, trocando mensagens de celular e conversando entre elas em código. Aos pitecos bêbados restou um grande repertório de piadas e ficamos rindo de quase tudo.
No fim, fiquei irritado. Por quais motivos nós complicamos tanto a vida quando o assunto é sexo e amor? Tremendo campo para todas as morais da humanidade. Na verdade, tenho minhas teorias para refletir esta questão. E não esqueço dos séculos de repressão do corpo, de distintas naturezas, do gozo e prazer, principalmente quando penso na mulher. E nos últimos trinta anos, com tantas mudanças tecnológicas e sociais, é natural confusão e angústia. Mas calma lá, é preciso se esforçar para abandonar algumas bobagens.
Irritado, rodei um bom tempo pela cidade. Adoro dirigir de madrugada. Esperei a barraca de pastel na feira, comi e fugi pra casa. Estava sem sono e liguei a TV, já sem pensar em nada, cansado. Por acaso, parei no GNT, que estava passando o Saia Justa. Peguei o programa na metade, mas percebi que o assunto era o dilema sexo e amor entre os gêneros. Não é possível. A aparente conclusão somada pela jornalista Mônica Waldvogel é que a mulher utiliza o sexo para despertar e segurar o amor no parceiro. O mesmo modelo do gutural uga-buga deflorando a Cinderela. Quanta idiotice.
Pois é, o texto ficou bem confuso. É que estou cansado desta moralidade estúpida, presente entre muitos jovens amigos, que coloca o amor como a arte da mulher e o sexo como ação do homem. Não é nada disto. Meus orgasmos foram conquistados com as mulheres que amei, abraçando e penetrando, misturando cheiros fortes, vibrando os órgãos, tremendo e chorando. Entre seus rins. Agora, qual é o problema de me excitar lendo Pedro Juan, pensando em situações eróticas ou buscando alguma diversão nos bares da cidade? Qual é a culpa de buscar prazer no sexo sem a preocupação de ser o novo príncipe encantado?